10/06/2016

Capítulo 02.


Apoio todo o meu corpo sobre a mediana escrivaninha. Selena mantém-se da mesma forma da qual chegou. Um corpo rígido, o choro dominante e pernas trêmulas. Eu continuo a encarando, olhando todo o seu eu por trás do meu ombro. Eu quero dizer a ela para acabar com o choro, mas eu entendo que a situação não é tão simples. E, de repente, eu quase choro.
Então sem pensar duas vezes, começo um assunto após quase dez minutos em silêncio:
— Você fez o teste de farmácia? — Selena tira suas mãos do rosto, passa as costas da mesma sobre os arredores dos seus olhos e nega com a cabeça.
— Eu passei mal nas últimas semanas. Não imaginei que pudesse ser isso, mas eu fui ao médico. — agora meu coração acelera ainda mais. Aquilo não tem nem a possibilidade de ser apenas um erro. — Ele disse que estou grávida de três semanas, Justin... Você foi o único garoto com quem eu estive. — ela não mente. Eu me lembro da noite em que estivemos juntos e do quanto ela pareceu traumatizada quando tudo acabou. Eu apenas vesti minhas roupas e saí do quarto. Não perguntei se havia algo de errado, não pensei que pudesse acontecer algo do gênero. — Eu não quero que você fique comigo, eu não vim te pedir isso, mas... Eu não sei o que fazer. Eu estou com medo.
— Isso não pode estar acontecendo... — sussurro para mim, mas ela escuta perfeitamente. — Eu preciso pensar um pouco, Selena. — aviso.
Enquanto pisco firmemente e aperto meus punhos, sentindo minhas veias se intensificarem, meu corpo agora parece fraco, talvez tenha sido a notícia com tamanho impacto.
— Você promete que não vai me deixar sozinha nessa? — sua voz parece tão aflita. Eu, por mais que não queira isso, não poderia deixá-la. — Por favor, Justin. — suplica.
— Eu não vou deixá-la sozinha nessa. — respondo. — Eu só preciso pensar um pouco. Meus pais vão acabar comigo, também. — sussurro. Dessa vez penso em como poderei contar isso a eles. — Eu só preciso de um tempo.
— Tudo bem. Por favor, me ligue. — ela balança a cabeça e vira seu corpo. Logo eu ouço a porta ser aberta, mas fechada segundos depois.
— DROGA! — grito tão alto que minhas cordas vocais falham antes mesmo que eu pudesse me arrepender de tal ato.
Com força, chuto a cadeira giratória, ela se espatifa ao chão e causa um barulho horrendo. O que eu pensei que não pudesse piorar aconteceu no segundo em que Hailey abriu a porta e perguntou o que havia acontecido. Ela disse que Selena saiu chorando e que não disse uma palavra sequer. Eu respondo a ela que preciso ficar sozinho. Isso gera uma pequena discussão, mas que no momento, não é nem de longe a pior coisa. Seu corpo inteiro sai pela porta e deixa o meu eu parado em frente à parede ao lado da janela. Apoiei meu corpo inteiro com minhas duas palmas abertas.  
No final da tarde, minha mãe aparece e pergunta se estava tudo bem. Ela perguntou também o que aconteceu em meu quarto, e me questiono como eu fui capaz de deixar certa coisa acontecer.
Quando anoitece, rigidamente eu desço as escadas e encaro meus pais sentados um ao lado do outro no sofá vermelho da sala. Eles parecem felizes, pois riem a cada três segundos.
Ao mover meu corpo até o perímetro desejado, eu vejo seus olhos seguirem até mim e a atenção de ambos é exclusiva.
— Precisamos conversar. — digo rápido, encarando o olhar calmo que mamãe me manda. Eu sei que isso é questão de segundos, logo eu veria a aflição em cada uma de suas íris.
— Aconteceu algo? — ela pergunta e reveza seu olhar entre mim e Jeremy. Delicadamente, balanço a cabeça e olho para o homem sentado. Ele expressa uma face desconfiada.
— Eu engravidei uma garota. — minha voz saiu quase como um sussurro, mas eu firmei meu timbre, pois não queria correr o risco de ter que repetir certa frase.
Então, quando se passam quase sessenta segundos, meu pai simplesmente pergunta:
— Como é que é? — pisco fortemente e desvio o olhar, observando a janela por trás do sofá vazio. — Olhe para mim, Justin. — exige. Eu o obedeço e simplesmente umedeço meus lábios.
— Vou ser pai. — novamente aviso. Aquilo não parece só uma informação, eu só queria que eles não me encarassem de uma forma esnobe e imunda. Eu espero pelo sermão desde o segundo em que ouvi “porque estou grávida”, mas eu não quero e nem preciso olhar a feição nojenta de ambos.
Pattie passa suas mãos na testa e eu sei que agora ela fecha seus olhos.
— Hailey? — a mulher pergunta.
— Não! — respondo e ela simplesmente me olha assustada. — É uma garota do colégio. Eu e Hailey havíamos terminado e eu fiquei com outra na festa do Dylan.
— Você engravidou uma qualquer? — de repente, o tom de voz de Pattie não é mais da forma que eu sou acostumado a ouvir. — O que deu em você, Justin?
— Eu não pensei que ela fosse engravidar logo na primeira vez. — quando eu respondo, Pattie se levanta e começa a caminhar de um lado para o outro. — Eu não sei o que fazer, tampouco ela. Desculpem-me... Eu só preciso... — bufo derrotado, encarando o carpete escuro. — Eu preciso de ajuda. Ela está desesperada e com medo.
— Será que você não aprende? Você só consome as idiotices que consome na rua? — pergunta Jeremy. — Agora me diga: o que é que você espera de nós?
— Eu não sei. — pigarreio e balanço meus braços. Pattie ainda está caminhando de um lado para o outro. Está impaciente e nervosa. — Mãe? — eu a chamo. Seus olhos claros me encaram no mesmo segundo, nem a mais e nem a menos.
— Justin... — ela resmunga e suspira forte. — Eu não sei o que você espera que eu faça, mas as coisas não são tão simples.
— Eu sei.
— Você tem certeza de que esse filho é seu?
— Ela era virgem. — confesso. Pattie sibila, acabada.
— E os pais dessa garota... Eles sabem sobre isso? — questiona a mulher.
— Eu acho que não. — eu me atrapalho um pouco para falar, mas tento não demonstrar minha aflição. — Ela me disse que está com medo, mas eu também estou. — concluo.
— Então, você vai lá. — diz Jeremy. — Você vai até a casa dessa garota e vai dizer aos pais dela sobre isso. Você vai arcar pelos seus atos. Se você foi homem o suficiente para fazer um filho, você será homem o suficiente para assumi-lo. — ele diz como se eu fosse ou estivesse querendo fugir. Eu não pensei nisso, eu sabia desde o começo que teria que fazer algo.
O domingo chegou como gelos sobre o céu. O dia estava pesado e frio. Eu acredito que tenha sido porque estive intrigado durante horas e horas, pensando e repensando em Selena e em como isso pode atrapalhar a minha vida. Eu pensei em ir à casa dela, mas a coragem escapou dos meus dedos, deslizou entre cada um, e só me sobrou o medo, algo que começa a dominar minha mente de uma forma irreal. Eu não estava preparado para ter um filho, muito menos com uma garota que mal conheço.
Então, à noite, ela me liga. Selena pergunta se estou bem. Eu posso entender seu tom choroso, ela com certeza passara o dia trancada, se lamentando por ter caído na minha suplica em uma noite de sábado, há exatas três semanas. Entretanto, isso me fez enxergar a culpa. Eu sou o culpado, eu insisti, eu não nos cuidei. A culpa era somente minha, e dessa vez, não há nada que pudesse encobertar meus caprichos. Eu realmente teria que arcar com as consequências.
— Justin? — sua voz profira pelo meu nome. Eu me sinto culpado só em escutar aquele tom de uma maneira diferente, ela continua mantendo um ar calmo, mesmo quando na verdade isso não é real. — Você não me ligou, então eu fiquei com medo de você simplesmente se esquecer.
— Eu passei o final de semana todo pensando, isso é algo que eu não vou conseguir me esquecer. — respondo baixo. Estou olhando pela janela, encarando a vista e as casas acesas. — Como você está?
— Eu ainda estou com medo. — confessa. — Contei aos meus pais.
— É! — resmungo um pouco e solto a pior das minhas respirações. — Eu também contei aos meus.
— Jura?
— Juro! — quase sussurro. — Como os seus pais reagiram? — estou curioso, eles devem estar piores que os meus.
— Não da melhor forma. Eu pensei que não teria para onde ir. — ela simplesmente chora e isso acaba comigo. — Eu fiquei com medo de eles me expulsarem... Eu não sei lidar com isso.
— Eu ainda não sei o que fazer, mas eu não vou deixar você sozinha nessa. — mesmo sem olhá-la, ela parece estar sorrindo. — A culpa foi minha. Eu não deveria ter insistindo naquilo.
— A culpa é nossa. — ela corrige e funga forte. — Você não me obrigou a nada. Eu fiz porque eu quis, eu deveria ter ido para casa, mas não fui. — aquilo me deixa pior. Não consigo idealizar isso. — Os meus pais querem que você venha aqui.
— Eu imaginei que eles fossem querer isso. — aviso. — Eu irei.   
(...)
Na manhã seguinte, eu encontro uma mensagem de texto. Há um endereço e, no final da frase, uma carinha triste. Ela parece bem mais sentimental do que o imaginado.
As nove e vinte sete da manhã, saímos. Durante o caminho, nada foi protestado. Meu pai dirige atentamente, às vezes, me olha, mas nada demais. A casa de Selena é do outro lado do bairro, na divisa do mesmo. Eu encaro toda a estrada pensando e treinando frases, eu não sei bem o que dizer quando olhá-la. A verdade é que eu sinto bem mais medo que ela. Reagir a isso não me parece uma boa escolha, porém é a única.
Desço do automóvel e encaro a casa amarela. É simples e aparenta estar calma. Pattie bate na porta três vezes. Ela olha para mim e passa suas mãos em meus cabelos ainda molhados, penteados para trás. Jeremy está atrás, encara seus sapatos formais. Então, quando a porta é aberta, meu coração gela e eu encaro uma mulher mediana e morena. Não preciso me esforçar muito para saber que ela é a mãe de Selena. Eu consigo enxergar perfeitamente a maravilhosa semelhança entre as duas.
— Oi. — mamãe é a primeira a dizer. — Eu sou Pattie, a mãe do Justin. — a mulher morena me olha e manda um sorriso aflito.  
— Eu sou Mandy. É um prazer. — ao dizer, as duas se cumprimentam com um beijo na bochecha. Jeremy aperta a mão de Mandy e sorri gentilmente.
— Jeremy. — diz. — Esse é o Justin. — sua voz está grossa. Parece querer arremessar todo o peso do seu punho sobre mim. Mandy não diz nada, apenas sorri e sussurra um “entrem”.
Há um homem sentado no sofá. Nós o cumprimentamos e nos sentamos no lugar vago. Estou encarando a pequena mesa que há ao centro, sob um jarro simples com um girassol. Gentilmente, Mandy nos traz limonada. Mamãe elogia e elas riem sobre algo que não compreendo. Jeremy foca seus olhos na casa. É um lugar simples, bem mais do que eu pensei.
Então, com uma voz rouca, eu questiono:
— Onde está Selena? — Brian, padrasto de Selena, responde após me olhar:
— Descerá logo, logo. — eu apenas assinto com a cabeça e volto a encarar o girassol. Posso perceber a forma hostil com a qual o homem me olha.
— Bom, eu quis que vocês viessem aqui, porque eu também não sei como agir em relação a isso. — confessa Mandy. — Minha filha é nova, ela não sabe nem ao menos se cuidar. — mamãe balança a cabeça positivamente, está prestando atenção nas palavras da mulher a sua frente. — Quando ela me contou, eu fiquei decepcionada, porque ela tem apenas dezesseis anos. — Jeremy, de repente, me olha. Eu também não sabia que Selena fosse mais nova que eu.
— Eu entendo. — diz Pattie.
Quando eu subo meus olhos, eu vejo Selena descer as escadas. Ela parece envergonhada. Está deslizando sua mão sobre o corrimão ao lado. Usa um vestido largo e seus cabelos soltos. Ela agora parece bem mais garotinha do que o normal. Isso me deixa inseguro, pois eu não sei bem o que se passa na mente dos meus pais.
Minha mãe a olha e simplesmente sussurra:
 Ela é só uma garota, Jeremy.
E de fato é verdade. Até seu semblante entrega isso.
Então, todo o seu corpo se move e para ao lado do sofá. Ela encara meus pais e dá um sorriso meigo. Pattie se levanta e se aproxima da garota, abraçando a mesma e deixando claro o quanto está encantada por vê-la.
— Eu sou a Pattie. — diz. Minha mãe sempre foi receptiva. Isso é sobre exatamente tudo.
— Eu sou a Selena. — responde a morena. Jeremy também se levanta e a abraça. Ele a recebe gentilmente como mamãe havia feito.  — Obrigada por virem. — Pattie sorri tão mais calma.
A garota me olha. Eu não consigo demonstrar nenhuma expressão. Apenas desvio o olhar e volto a encarar a flor amarela, a que eu estive olhando desde a minha chegada. Então, sem delongas, o assunto continua.
— Nós não queremos que ele tenha algo com ela, eu só espero que possa ajudá-la. — a voz de Mandy novamente diz. Eu já sei sobre isso.
— Isso você não precisa se preocupar. — diz Jeremy. — Justin irá ajudar com absolutamente tudo. — Brian balança a cabeça e me olha firmemente.
— E como está se sentindo, Selena? — questiona mamãe. — Você contou a suas amigas? — a morena balança a cabeça e massageia seus lábios com os próprios.
— Elas não souberam o que me dizer.
— Eu imagino. — rebate Pattie. — E o colégio?
— Eu não estou indo, porque mesmo que eu esteja apenas de três semanas, eu não quero que as pessoas saibam sobre isso. Elas seriam cruéis comigo. — quando Selena diz, eu a olho, pois não havia pensado nisso.
Mamãe tentou motivá-la, ela até a fez sorrir algumas vezes. Passamos quase cinco horas conversando, e quando fomos embora, continuei calado. Jeremy não disse nada, tampouco Pattie, mas eu sabia que ao chegar em casa teríamos uma conversa séria sobre isso.
Então, assim que largo meu casaco no sofá e viro meu corpo, mamãe começa um assunto:
— Eu espero que já tenha pensado no que fazer. — nego com a cabeça, não consigo retirar meus olhos dos dela. — Ela é muito nova, Justin. Eu não falo apenas sobre idade. Ela é uma criança... Completamente. E eles não estão pedindo nada que você não tenha a obrigação de fazer.
— Eu sei, mãe, eu sei. — quase grito. — Acontece que eu não quero ter um filho. Eu tenho dezenove anos, estou terminando o ensino médio, tenho planos para a faculdade fora da cidade. Eu também não sei o que fazer.     
— Faculdade fora da cidade? — debocha Jeremy, ao adentrar na sala. — Eu sugiro que reveja seus planos, porque isso será completamente impossível. Você deveria ter pensado nisso no segundo em que transou com aquela garota e não se preveniu. Agora ela está grávida e você viu como ela parece assustada? Eu não sei o que está passando pela sua mente agora, mas você vai acordar bem cedo amanhã e resolver a sua vida, porque eu não vou cuidar de filho seu. — eu engulo o seco, não sei o que respondê-lo. — Aquela garota não tem condições de passar pela gravidez sozinha. Você está me entendendo?
— Eu vou ajudá-la.
— Claro que você irá ajudá-la. — novamente ele debocha. — Você irá até a casa daquela sua namoradinha e vai acabar com esse seu namorinho ridículo. Então, depois você irá à casa de Selena e vai fazer o eu quero que você faça. Você sabe bem do que estou falando. E fará isso sem reclamar, sem agir como se tivesse alguma opção.
Eu giro meu corpo após recolher minha jaqueta, caminho até a escada e piso nos dois primeiros degraus, porém antes de terminar meu caminho, ouço sua voz rouca soar outra vez:
— Não me decepcione outra vez, Justin.
Quando adentro em meu quarto, jogo a jaqueta no chão e deslizo o celular do bolso. Ao terceiro toque, ouço sua voz fina perguntar pelo meu nome:
— Justin?
— Você pode me encontrar? — ela demora um pouco para responder, mas logo ouço sua voz em um simples murmuro:
— Aham!
— Estou te esperando no parque.
— Tudo bem.  
Dirijo tão rápido que sinto meus braços pulsarem. Às vezes, noto o choro preso na minha garganta, mal consigo acreditar no que eu farei nesse exato momento, me encarando pelo retrovisor deveras amargo, com um semblante aflito e meus olhos tão mais desmanchados do que algumas vezes estiveram.
Quando desço do carro, eu a vejo sentada em um dos balanços. Suas mãos seguram a imensa corrente e a balança com calma. Caminho chutando a areia, notando o vento ainda forte, me arrependendo por não ter pegado a jaqueta
Selena me olha e sorri delicadamente. Semeio uma balançada de cabeça e simplesmente me sento no balanço ao lado.
— Eu pensei em tirá-lo. — arregalo meus olhos e a encaro no mesmo segundo. Isso é uma das coisas que nem ao menos passou pela minha cabeça.  
— Não, você não tem que fazer isso.
— Não fará muita diferença, ele ainda é só um grãozinho. — Selena me olha profundamente, eu me nego a aceitar ouvi-la dizer isso. — Você nem me conhece, embora sejamos do mesmo colégio. E você só me notou àquela noite, porque eu fiz por merecer.
— Esquece isso, Selena. Você não vai matar esse bebê. — ela balança a cabeça e encara o chão coberto por areia. — Eu pensei muito, pensei tanto que pude sentir minha mente se quebrando por dentro. Eu disse que não vou deixá-la sozinha nessa.
— Eu acredito. Eu já disse que você não precisa ficar comigo, afinal, você tem uma namorada.
— Selena, olhe para mim, por favor! — a morena volta a me olhar e eu tremo.
— Você está com frio? — nego com a cabeça e ela ri. — Você quer a meu casaco?
— Não precisa. — sou sincero e passo a língua sobre meus lábios. — Quer casar comigo? 


"Eu vi seu rosto na multidão, e eu não sei o que fazer, porque eu acho que não posso ficar com você."

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